O painel, que contou com a presença de Catherine Mann, Banco da Inglaterra, Martin de Koch, Banco Central da Áustria/Conselho do BCE, Jim Bullard, ex-presidente do Fed de St. Louis e Axel Weber, (ex-presidente do Bundesbank), focou o debate nos riscos atuais à estabilidade monetária e na crescente tensão entre política e independência dos bancos.
As conclusões foram: as incertezas globais permanecem elevadas, mas as políticas monetárias devem manter-se prudentes e flexíveis; as ameaças políticas à independência do Fed são mais ruído do que risco concreto, pois há barreiras legais, institucionais e reputacionais robustas; e o debate semântico entre “independência” e “autonomia” reflete uma tentativa de preservar a eficácia técnica dos bancos centrais sem confrontar o poder político — um equilíbrio essencial num mundo de crescente politização da política monetária.
Catherine Mann (Banco da Inglaterra)
Mann destacou que o Reino Unido enfrenta um ambiente de turbulência global em três dimensões: comercial, financeira e geopolítica, mas que a inflação doméstica ainda é o principal desafio.
Ela observou que:
- Spillovers comerciais e cambiais (como reorientação de fluxos e apreciação da libra) ainda têm impacto limitado sobre os preços.
- Já os efeitos financeiros vindos do exterior (Fed, BCE, BoJ) afetam de forma crescente as condições domésticas.
- O principal motor da inflação segue sendo interno: forte alta do *salário mínimo nacional, pressões em *preços de alimentos (agravadas por Brexit e novas regulações) e inflação de serviços acima de 5%.
Para Mann, a política monetária deve permanecer restritiva, pois as expectativas inflacionárias das famílias estão se desancorando, o que dá sustentação a repasses adicionais de preços.
Martin de Koch (BCE)
O novo presidente governador do Banco da Áustria ressaltou que a incerteza global derivada de tarifas, mudanças nos fluxos de comércio e instabilidade política dificulta a leitura dos dados e a calibração da política monetária.
Mesmo assim, o BCE vê:
- Crescimento modesto e estável (em torno de 1%) na Zona do Euro;
- Inflação próxima da meta (2,1% em 2025 e 1,9% em 2027).
De Koch defendeu prudência e vigilância, mas sem “excesso de zelo”: “Enquanto estivermos próximos da meta e sem choques externos relevantes, não há razão para ajustes precipitados.”
O BCE deve continuar com abordagem “meeting by meeting”, preservando flexibilidade e poder de resposta rápida. A próxima movimentação de juros, segundo ele, ainda seria de alta, mas distante no tempo.
Jim Bullard (ex-Fed)
Bullard apresentou uma leitura otimista da economia americana, avaliando que o crescimento segue acelerando graças a políticas pró-negócio e à expansão de investimentos em tecnologia e IA.
Principais pontos:
- A ameaça de uma guerra comercial tipo “Smoot-Hawley” não se materializou, o que reduziu a incerteza.
- O mercado de trabalho mostra sinais mistos — desaceleração no payroll, mas por fatores de mensuração e restrições migratórias, não fraqueza real.
- A inflação segue acima da meta, e o Fed deve concluir os 75 pontos-base prometidos, embora o aumento de dezembro esteja em risco.
Bullard enfatizou que tarifas não geram inflação persistente, mas apenas um salto de nível de preços, devendo, portanto, ser “olhadas através” pela política monetária.
Independência do Fed
Bullard argumentou que o termo “independência” é inadequado: “O Fed não é completamente independente da política, mas deve operar a uma distância (‘arm’s length’) dela.”
Ele destacou que a estrutura híbrida (governadores em Washington e 12 bancos regionais) garante decisões coletivas e equilíbrio institucional.
Sobre a ameaça da Casa Branca, o julgamento da Suprema Corte sobre o Federal Reserve Act e a possibilidade de demitir membros como a governadora Lisa Cook. Bullard considerou improvável um ataque bem-sucedido a autonomia do Federal Reserve. Ele acredita que a Corte buscará preservar a integridade do Fed, mantendo *proteções contra demissões arbitrárias.
Um eventual afastamento, segundo ele, “seria um golpe duro” e geraria reação imediata do Congresso e dos próprios Conselhos dos Bancos Regionais, tornando a ameaça pouco crível e operacionalmente ineficaz.
Axel Weber (ex-Bundesbank)
Weber analisou a conjuntura sob o prisma dos mercados e da Europa.
Segundo ele, vivemos uma era em que resiliência e fragilidade coexistem:
- Os EUA “desafiam a gravidade”, mas em algum momento sentirão o peso da desaceleração.
- A Europa está “apenas se mantendo”, com riscos crescentes vindos da desaceleração chinesa e das tarifas americanas.
- O continente enfrenta ameaças estruturais: falta de coordenação política, risco de fragmentação e tensões entre Alemanha e França.
Weber alertou para dois cenários extremos:
- Europa fortalecida e integrada, se implementar as reformas propostas por Draghi (União Bancária, de Capitais e de Investimentos);
- Europa fragmentada, caso prevaleça o nacionalismo fiscal e comercial.
Ele também advertiu contra uma “infantilização” europeia em resposta às tarifas americanas: se o continente adotar *retaliações e barreiras digitais, todos — inclusive os EUA — *sairão perdendo.
Debate sobre Independência vs. Autonomia
Encerrando o painel, um dos moderadores destacou a preocupação dos bancos centrais de vários países com a discussão sobre *independência do Fed, vista como **um bem público global: se a credibilidade do Fed for abalada, *todas as moedas sofrem.
Propôs-se uma distinção conceitual:
- Independência de objetivos (definir as metas) cabe aos governos;
- Autonomia de instrumentos (como atingi-las) cabe aos bancos centrais.
Essa terminologia — “autonomia” em vez de “independência” — seria mais apropriada politicamente e reduziria o atrito entre tecnocracia e autoridades eleitas.
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