A nova fase da estabilização argentina: previsibilidade, reformas e reconstrução de reservas

A nova fase da estabilização Argentina deu início a uma nova etapa econômica, agora sob o escopo de um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI) via a Facilidade Estendida de Financiamento (EFF, na sigla em inglês). O programa prevê US$ 20 bilhões em quatro anos, com 60% (US$ 12 bilhões) sendo desembolsados de forma antecipada, um volume elevado, ainda que com precedentes em países como Brasil, Turquia e México.

A duração de quatro anos do acordo busca oferecer previsibilidade em relação ao papel do FMI no processo de estabilização. O desembolso antecipado equivale a um aumento líquido de US$6 bilhões na exposição da Argentina ao Fundo, considerando os vencimentos de cerca de US$14 bilhões no mesmo período. Esse período mais longo permite um foco maior em reformas estruturais, reduzindo a pressão por resultados imediatos, de acordo com o FMI.

Após a primeira fase de estabilização, centrada em uma âncora cambial que reduziu rapidamente a inflação e as expectativas inflacionárias, o foco agora se desloca para maior flexibilidade cambial e o equilíbrio entre estabilidade interna (controle inflacionário) e externa (reservas internacionais e balanço de pagamentos).

A reconstrução das reservas e a retomada da confiança

Um dos pilares centrais do programa é a reconstrução das reservas internacionais, etapa essencial tanto para mitigar choques futuros quanto para permitir o retorno gradual da Argentina aos mercados internacionais de capitais, previsto para o início do próximo ano.

A política cambial abandonou o “crawling peg” e, agora, adota as bandas cambiais ampliáveis ao longo do tempo. Dentro dessas bandas, não haverá venda de reservas, exceto em casos de disfunção de mercado. Ao mesmo tempo, há metas específicas para acumulação de reservas líquidas (por exemplo, US$4 bilhões até junho, excluindo desembolsos líquidos de organismos multilaterais).

Três pilares do novo programa econômico

  1. Âncora fiscal: a meta de superávit primário é de 2,5% do PIB no médio prazo, o que exigirá reformas nas áreas tributária e previdenciária. A política fiscal é fator crucial para o programa.
  2. Política cambial e monetária: a transição cambial exige um regime monetário robusto. A ideia inicial é a política monetária ser baseada em metas de agregados monetários, com as taxas de juros sendo determinadas de forma endógena. As metas incluem NIR (reservas internacionais líquidas) e NDA (ativos domésticos líquidos). Choques de liquidez serão enfrentados com esterilização via emissão de títulos, e não com vendas de reservas.
  3. Reformas estruturais: incluirão a desregulamentação da economia, aumento da flexibilidade dos mercados de trabalho e produto, eliminação de restrições cambiais como a taxa blend, e a simplificação dos controles de capital.

O principal desafio passa a ser a implementação efetiva dessas medidas. Os primeiros sinais são positivos, com aceitação do novo regime cambial e indícios de estabilidade. A primeira revisão do acordo está marcada para junho.

Segundo o FMI, é crucial que o sucesso do programa não dependa apenas do retorno aos mercados de capitais. A sustentabilidade da estratégia exige também o equilíbrio das contas externas via balança comercial e conta corrente.

O uso de metas de agregados monetários, interpretado pelo FMI como um retorno aos fundamentos, já foi eficaz para controlar a inflação em países como Colômbia e Chile, mas falhou no Brasil nos anos 1980. Para a Argentina, a transição bem sucedida para um regime de metas de inflação dependerá da ancoragem das expectativas e da estabilidade cambial. O objetivo é reduzir a inflação para 1,5% ao mês antes das eleições, embora esse resultado dependa da credibilidade e execução da política econômica.

Por fim, reconhece-se que há riscos, como saída de depósitos e pressão cambial. Porém, as bandas amplas adotadas visam justamente mitigar a necessidade de intervenções frequentes, com vendas de reservas previstas apenas para situações de disfunção de mercado.

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Produzido por Tatiana Pinheiro, economista-chefe da Galapagos Capital 

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